
Primeira pergunta que não quer calar: Quem é o Gabriel Aleixo?
Aleixo: O Gabriel é um ser que ficou perdido no passado faz uns 15 anos. Ainda quando era novo, na escola, chegou num ponto em que minha turma tinha 3 ‘Gabriéis’. Aí sim, eu virei o Aleixo que todos conhecem.
Mica: E ser Aleixo te define? Muda alguma coisa o Gabriel ficar guardado no documento?
Aleixo: Apesar de ser algo simbólico, acredito que mude na prática sim. Adoro meu nome como um todo, mas Gabriel é algo tão normal que chega a ser genérico. Gosto que me chamem pelo sobrenome, pois dá um tom particular que eu sempre busco em mim. Autenticidade é sempre importante, né. Não no sentido de fazer questão de ser diferente ou “ter estilo”, mas como uma busca legítima de fugir do ordinário. Sempre me defini por meus gostos diferenciados, seja pela música, pelos filmes ou pelas pessoas! Mas o Gabriel ‘genérico’ do passado é uma marca bem bonita da infância, daquele passado em que a simplicidade sempre basta.
Kelly: Aleixo, você é mineiro mas atualmente mora no Rio de Janeiro e já passou também pela Inglaterra. Como tem sido a experiência de mudar de cidade e país nestes últimos anos, e o que isso acrescentou para o Aleixo de hoje?
Aleixo: Essa pergunta é bem interessante. Eu nasci e vivi em Juiz de Fora até os 18 anos, quando então me mudei buscando oportunidades acadêmicas melhores. Mas aqui faço uma ressalva, JF é uma cidade universitária e tem ótimos cursos. Acontece que, talvez pelo espírito aventureiro ou ‘alternativo’, eu fui gostar do que é melhor em outros lugares! Em um mesmo ano (2007), eu morei em 3 cidades diferentes. Juiz de Fora, Itajubá (no sul de MG) e Rio de Janeiro, essa última pra qual vim, me apaixonei e fiquei. É interessante, motivador e desafiador mudar de cenário tão rápida e bruscamente. Tive que fazer e refazer amigos e, curiosamente, passei a me conhecer melhor mais do que aos outros. Nessa situação, você percebe o que te atrai de verdade nas pessoas. Mais do que uma afinidade de gostos ou condutas, acredito que são os valores e o ‘jeito’ mesmo! Na Inglaterra, infelizmente foi só passagem. No entanto, ver o mundo “de fora” é uma experiência fantástica, mais do que recomendada.
Mica: O que estudou?
Aleixo: Fui a Itajubá iniciar o curso de Engenharia Mecânica. Chegando lá, dediquei meu tempo muito mais a uma organização chamada AIESEC do que à faculdade em si. Isso me despertou o interesse por Economia e Administração, pois eram áreas cobertas pela atuação dessa organização. Logo, vim ao RJ e cursei, por 3 anos, Economia na Fundação Getulio Vargas. Nesse ano, pedi transferência e terminarei a graduação em Administração! Mas, dessa vez, prometo: vou até o fim!
Kelly: O fato de você ter mudado para Administração tem a ver com a BrouBier? Aliás, vamos explicar aqui para os leitores, o que é a BrouBier?
Aleixo: A minha mudança para o curso de ADM tem a ver com o espírito empreendedor e demais interesses que desenvolvi ao me ver frustrado com o curso de Engenharia. A passagem por Economia, por mais que tenha sido interessante - trata-se de uma ciência que muda radicalmente sua forma de enxergar o mundo - não teve tanto sentido prático. Eu fui fazer Economia só porque, supostamente, é um curso mais “sério” do que Administração. Hoje, bem mais maduro, vejo que não tem nada disso. Sobre a BrouBier, o caso é interessante. Apesar de ter começado a beber meio velho (aos 18 anos), pros padrões, apaixonei-me pela cerveja. Daí, entre conversas técnicas com um amigo de infância que me iniciou nesse mundo e a sugestão de um professor de História Econômica (!) da faculdade para que eu fizesse um curso e virasse cervejeiro caseiro... nasceu a BrouBier! É uma confraria formada por mim e mais 3 colegas. Enfim, good beer no shit! Amizade, cerveja e paixão por fazer as coisas artesanalmente. É basicamente isso, fazemos boas cervejas nas nossas próprias casas. Diferentes estilos, sensações novas, tudo bem interessante. Não dá pra negar as pretensões de profissionalizar a atividade, até porque o mercado cresce loucamente, mas hoje ainda é algo intensamente ligado ao prazer de criar algo próprio, um hobby.
Kelly: Dá mesmo pra fazer cerveja em casa e sair algo de boa qualidade?
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Aleixo e os amigos dando um 'brou' em comemoração! |
Mica: Aleixo, mesmo sendo um hobby, você vende as cervejas que produz?
Aleixo: Essa pergunta sempre é feita a nós e a resposta é simples e direta. Se sobrasse cerveja, nós venderíamos! Mas, no nível atual, nós e os amigos próximos damos conta de tudo o que é feito. Justamente para contornar o problema estamos em “obras” e a capacidade de produção será dobrada em Dezembro. De qualquer modo, a venda formal exige o uso de equipamentos profissionais e registro de receitas no Ministério da Agricultura (por mais que alguns estabelecimentos não liguem muito pra isso, principalmente em cidades de interior). No futuro, é um projeto, sem dúvidas. Mas hoje o nosso pagamento é em orgulho, ao ver os elogios dos bebedores, e diversão, durante o processo! Amigos e cerveja, não tem como dar errado.
Mica: Soube que além de se arriscar como mestre cervejeiro, você também se arrisca na poesia...
Aleixo: Como dá pra perceber, eu gosto é de criar. O que, não importa tanto. Por mais que, obviamente, eu me foque no processo criativo daquilo que me chama mais atenção. A poesia já esteve mais forte na minha vida. Eu sempre gostei de escrever, mas esse negócio de poesia começou com uma brincadeira no Ensino Médio. Eu escrevia coisas absurdas, com aquele tom modernista que encanta qualquer estudante adolescente, os amigos gostavam, distribuíam folhas arrancadas de caderno entre si com os rascunhos e, curiosamente, pediam mais. Depois de um tempo, passei a (tentar) escrever sério e até criei um blog aposentado. Aquilo era muito mais um diário do que uma expressão aberta de sentimentos, tanto que nunca o divulguei muito! Hoje, meu tempo de produção artística é quase que integralmente dedicado à música. Acredito que, por essa ser uma arte abstrata, abarque melhor os sentimentos que eu busco e transmito atualmente.
Mica: Qual instrumento você toca? Compõe também?
Aleixo: Eu toco tudo que tenha teclas. Na atualidade, muito mais o piano do que o teclado ou a escaleta. Basicamente, eu componho. Raramente tiro música de outros artistas. Quando gosto de uma música, prefiro ouvir a original. O propósito do compositor está colocado muito melhor ali do que em algo que eu poderia fazer por cima. Mas não sou radical com isso, apenas acho que não levo jeito pra coisa. O tempo me tornou um músico muito informal. Quando eu comecei a brincar com o jazz, aí que a coisa se perdeu de vez... O improviso e as composições próprias tomaram meu “repertório”.
Kelly: Você escreve poesias, toca piano e o que poucas pessoas poderiam imaginar, é que você também escuta rock pesado. Como você consegue, englobar toda essa complexidade de estilos e sensiblidade?
Aleixo: É a esquizofonia, né. A playlist aqui vai de Ella Fitzgerald a Burzum. Como eu disse lá em cima, em relação a pessoas: com o tempo, você descobre o que te chama a atenção nas coisas. Mais do que a forma ou a superfície, acredito que seja a essência, o “jeito”, o que define aquela coisa como X e não Y. E, pra mim, o mesmo vale pra música. É uma linguagem, a mais abstrata que temos na arte. Se você entende as diferentes linguagens que a compõem (seja o jazz, o death metal, o rock progressivo, o samba ou o pop), você percebe o sentimento por trás daquilo independente da estética, da superficialidade. E isso é lindo! Enfim, a sensibilidade vem do fato de eu sempre ter sido um cara bem cabeça aberta. A vida toda sempre lidei com todo tipo de gente, do mais playboy ao mais Barizon (o metaleiro vagabundo do Hermes e Renato). Aprendi a ver como cada pessoa expressa seus sentimentos e expectativas e peguei um pouco do gosto de cada uma. Claro que com pequenas ressalvas, impostas por puro e simples bom senso.
Kelly: Falando de pessoas, quem te conhece sabe o doce de pessoa que você é. Sempre trata os amigos com extremo carinho e tem os melhores conselhos do mundo! Diga, como um 'garoto' conseguiu amadurecer tão cedo para ter uma visão tão bem formada da vida?
Aleixo: Ah, isso é uma visão sua. Cada um empresta às coisas o ouro que possui... Se você vê assim, é porque me trata da mesma maneira e eu apenas retribuo. Mas, brincadeiras e poesias à parte, um amigo me disse uma coisa que até hoje acredito me definir bem. Ele falou que eu pareço ter subido a montanha, pensado em tudo e sempre ter alguma coisa relevante pra comentar sobre essas questões da vida. Acho que é a solidão auto-imposta mesmo. Passo muito tempo só, em boa parte por escolha (e por morar sozinho, claro), e nessa situação é inevitável confrontar a si mesmo e ao que te cerca. Descobrir seu ‘dark side’, os sentimentos que te tomam nos momentos de maior necessidade. Se existe algo que eu chamo de maturidade é isso, entender toda a fraqueza e a miséria que cercam as pessoas e conseguir aceitá-las. A partir disso, tudo fica bem bonito. Realismo e poesia combinados ao extremo haha!