Mulheres aderindo a linguagem 'mina, mano, treta, truta, é nóis e
palavrões' e Homens falando como mulheres 'estou indo nanar, vou mimi,
quero fazer xixi...' O que está acontecendo?
Semanas atrás, recebemos de um amigo e leitor, a sugestão para que o
caso feminino citado acima fosse abordado porque tal linguajar o
incomodava. E daí, lembramos também que algo parecido tem ocorrido no
universo masculino - só que ao contrário. Saia justa: sim ou claro? Lá
vamos nós!
Mica: Vamos por partes: mulherada super gíria. Confesso que não conheço muitas, talvez seja um fenômeno novo (a velha), mas tem coisa que sempre fica estranha. Não exatamente por ser mulher, mas por estar relacionado a algum estereótipo. Tipo “mano” na década de 80 - minha adolescência - mano era coisa de trombadinha. Então ninguém que não era trombadinha queria falar mano e ser identificado com isso. Hoje já é normal, mas eu continuo odiando.
Kelly: Em São Paulo, desde que eu nasci e tenho conhecimento, sempre foi natural o uso do 'meu'. E pra mim ficou claro que de uns anos pra cá, o 'meu' foi parcialmente substituído por 'mano'. Eu não sei com que frequência 'mano' é usado em outros estados, mas sei que em SP, tanto no interior como na capital paulista, se tornou comum. Também sou da época que 'mano' soava horrível, vindo tanto da boca de um homem quanto de uma mulher. Hoje, ainda é feio para algumas pessoas, e não é para outras. Eu me encaixo na turma do 'não', pelo simples fato de que toda vez que ouço 'mano', não enxergo como 'vocabulário de trombadinha' e sim o 'meu' de forma disfarçada. Porém, se pega mal para mulher, hmmm, complicado. Eu assumo que falo 'meu, mano e treta' com amigos. Digamos que rola uma piada interna, e que quando falo deste jeito, estou no 'modo brincadeira'. De qualquer forma, só uso com quem tenho intimidade. Confesso que não falaria assim com um professor da faculdade ou com meu chefe, por exemplo. Acharia horrível. Não teria porque falar assim com eles. Enfim...
Mica: O próprio conceito de gíria traz a ideia de que é a linguagem de determinados grupos. Assim como as brincadeiras internas, algumas gírias só fazem sentido nestes grupos. Mas pensando se isso atrai ou não numa pessoa, a resposta é sim. Porque tem cara que vai olhar pra mina falando gíria e pensar “credo, que maloqueira!” e outros que vão suspirar de amores... Cara que fala errado me brocha. Excesso de gíras também. Uma vez um cara chegou em mim com a seguinte frase “e aí mina, qual é a do molho!?” Resposta: tomate. Ah vá!
Kelly: Sim, cada um tem um gosto e palpite do que é atraente. Falando de mulheres, se é certo ou não, se é bonitinho ou deixa de ser, é difícil criar uma regra aqui. A Glória Kalil provavelmente diria que é péssimo, hahah. Mas eu, particularmente, acharia um saco falar formalmente o tempo todo. Porém, concordo que o excesso cansa. Comigo ainda não aconteceu de ter contato com uma garota que fala 5 vezes a palavra mano numa frase, senão, certamente me incomodaria [assim como acho que QUALQUER palavra que é usada demasiadamente, cansa].
Mica: O meu querido José Saramago dizia “a língua é a maior expressão cultural de um povo”. Não é só a língua culta - gírias, regionalismos e neologismos também entram nessa conta. O triste é ver que as pessoas não valorizam isso. Saber falar corretamente não implica não falar gírias e tal. Ter uma linguagem mais solta também não implica em não saber falar corretamente. Uma coisa não briga com a outra. Outra questão é saber onde e quando empregar cada coisa. Eu não vou chegar na balada e começar a despejar o vocabulário mais culto do mundo. Mas também não faz sentido me apresentar para um paquera da forma mais tosca do mundo... Eu não sei quem é o cara, eu não sei se ele vai me entender, se isso vai facilitar ou atrapalhar. Linguagem serve para interação e isso só rola se as pessoas se entenderem... um mínimo de esforço é necessário, poxa!
Kelly: Falando sobre homens, percebo que assim como algumas mulheres estão "falando que nem macho", de repente, vejo cada vez mais homens falando como menininhas. Eu tenho HORROR quando um cara fala/escreve 'vou nanar, vou mimi'. SÉRIO. Poderia ser o Gael García Bernal, eu deixava falando sozinho! Se estou sendo radical, não importa, a questão é que cada um tem uma lista de coisas que atraem ou afastam. E tenho consciência que, assim como me acho no direito de achar tosco homem que fala deste jeito, também não posso reclamar caso ele entorte a boca ao me ouvir falando um palavrão. Questão de gosto. Até porque, nenhum dos dois é obrigado a estar com o outro no final. Pronto.
Mica: Linguagem de criança e voizinhas ridículas é a típica coisa que me faz olhar para trás e pensar: aff Micaela, que vergonha! No meio do namoro, já aconteceu mais de uma vez, mas depois que a paixão acaba, volta a ser ridículo. No entanto ainda dá pra entender, coisas de namoro. Agora ver o cara postando no facebook “vou nanar” é algo que me deixa com cara de ponto de interrogação e a pior impressão possível do bofe. Isso é coisa de moleque mimado que não virou homem ainda e tá procurando uma substituta para a mãe.
Kelly: Enfim... se analisarmos o porquê desta 'troca', quais seriam as conclusões? A de que os homens estão mais sensíveis e as mulheres masculinizadas? Não sei. Aposto que há mulheres que acham uma graça 'homem que faz pipi', assim como tem caras que sorriem quando a garota diz 'E aí, firmeza?'. Como cada um dos sexos vai lidar com isso, acredito que não dá pra generalizar.
Mica: Eu acho que é culturalmente mais amplo do que masculinizadas ou feminilizados. Acho que as interpretações disso vão estar mais ligadas a visão de mundo como um todo, para além dos papéis sexuais. Exemplo: eu não acho masculinizado falar “mano”, me remete mais a pobre, ladrão, vulgar. E não acho feminilizado falar como criança, me remete a criança mesmo. Já para o nosso leitor, as garotas ficam masculinizadas e feias. Ele está errado? Eu estou errada? Não. Mas se escolhemos nos colocar assim, temos que lidar com o que vamos parecer aos olhos dos outros. Não que isso importe, mas rola. Se você não quer parecer criança, não fale como criança. Se pouco se importa, fale. Porque sempre vai ter quem gosta e quem deteste.
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